Revista online do Demac
www.demac.uerj.br/informativo

v. 1, no II, p. R1, (2007)

Abstração versus Aplicação: a Matemática e a Transmissão de Informação
por
Juscelino Bezerra e Patrícia Nogueira
Departamento de Matemática e Computação, Faculdade de Tecnologia, 
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Resende, R.J, Brasil.


Em nosso mundo físico, desde muito tempo, o homem com a sua capacidade de percepção, do que julga ser um problema e o desejo de significar qualquer ação capaz de resolvê-lo, usa a matemática como um sistema formal de pensamento para reconhecer, classificar e explorar padrões. A matemática é uma linguagem universal (é uma linguagem porque é formada por signos lingüísticos que passam idéias e significados) e no método matemático, no qual a partir de indícios deduzem-se regras, temos um tipo de beleza que se aplica as idéias e não somente às coisas.

Esse sentido etéreo e atemporal das idéias matemáticas já pode encontrado nos antigos gregos com Platão, não se fazendo durante muito tempo uma distinção clara entre a matemática útil/aplicável e a abstração pura. Tal dicotomia começa a se fortalecer no final do século dezenove culminando no início do século vinte com o crescente grau de abstração e formalismo matemático. Daí em diante as teorias matemáticas foram se tornando cada vez mais complexas e aparentemente distantes do ”homem comum. A ponto do famoso matemático G.H.Hardy em seu livro ”Apologia do Matemático” escrever ”se um jogo de xadrez é, num sentido rude, ”inútil”, então isto é igualmente verdade para a maior parte da mais refinada matemática (...). Eu nunca fiz nada ”útil”. Nenhuma descoberta que fiz já produziu, direta ou indiretamente, para o bem ou para o mal, a menor diferença na melhoria do mundo.” 

Hardy estudava Teoria de Números e se orgulhava, em meados dos anos 40, de que não havia nenhuma utilidade bélica para a mesma. Hoje, porém, existem grandes aplicações da Teoria de Números na segurança da transmissão de informação (criptografia) o que tem obviamente relações estreitas com o mundo ”bélico” e ”capitalista”! Na verdade, a maior parte dos matemáticos hoje talvez compactue com as idéias expostas pelo físico matemático Roger Penrose no livro ”The enperor’s new mind”: ”De um lado a matemática deve ser estudada e compreendida por si mesma, e não devemos querer uma aplicabilidade totalmente exata aos objetos da experiência física, do outro, o funcionamento do mundo externo concreto só pode, em última análise, ser entendido em termos da matemática precisa.”

Seguindo tal raciocínio, não é estranho aos matemáticos que certos padrões e estruturas matemáticas possam ser identificados no mundo concreto, ainda que tais padrões façam parte da álgebra, uma das áreas mais abstratas da matemática. É o que ocorre em uma das mais interessantes aplicações do pensamento puro matemático propiciado pelo nosso moderno mundo digital: os códigos corretores de erros.

Quando escutamos uma música através de um CD estamos neste processo utilizando um sistema de reprodução sofisticado que traduz uma música que está digitalizada para uma música em formato de som correta. Os CDs podem reproduzir qualquer sinal digitalizado, ou seja, transformado em dígitos binários, além dos sinais de áudio. 

Este processo de reprodução, seja de um CD ou de um disco de vinil, consiste da leitura de uma informação codificada, por meio digital no caso do CD, e decodificada por meio de áudio. Codificação significa a modificação de características de uma informação para torná-la mais apropriada para uma aplicação específica, como por exemplo, transmissão ou armazenamento de dados. Garantir que uma grande quantidade de informação transmitida pelos mais variáveis meios chegue intacta ao receptor e possa ser lida, escutada no caso de uma mensagem de áudio, é um problema abordado pela área da teoria da informação chamada de Códigos Corretores de Erros, o qual pode ser visto como uma ferramenta que visa recuperar informações que no processo de emissão tenham sofrido algum tipo de ruído. 

Pode-se afirmar que hoje praticamente todo sistema de envio de informações possui algum tipo de código corretor de erros. Como exemplos típicos, a telefonia digital, a transmissão de dados via satélite, a comunicação interna em computadores, armazenamento óptico de dados e armazenamento de dados em fitas ou disquetes. 

 Próxima página


R1

E-mail: patricia@fat.uerj.br

Copyright by    Demac