Revista do Demac
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Oliveira Neto


3-    PROPRIEDADES DOS BURACOS NEGROS

      Nessa seção vamos algumas das mais importantes propriedades dos buracos negros. Para isso nós nos restringiremos ao estudo do buraco negro mais simples o chamado buraco negro de Schwarzschild.

    Esse buraco negro surge da solução das equações de Einstein para o vácuo com simetria esférica, as quais foram derivadas pela primeira vez por Karl Schwarzschild em 1916, a apenas alguns meses depois da publicação das equações de Einstein.

    Esse buraco negro é caracterizado completamente pelo parâmetro M, o qual é identificado como a sua massa quando vista por um observador distante. Vejamos agora algumas de suas propriedades.

3.1-    GEODÉSICAS

    Na física Newtoniana, a gravitação é representada por uma interação a distância entre as partículas massivas. Já em relatividade geral, a interação não é representada por uma interação diretamente entre as partículas massivas. Na verdade cada partícula massiva deforma a geometria do espaço-tempo ao seu redor desviando assim a trajetória das demais partículas que se aproximem dela, e vice-versa. Logo, esse desvio da trajetória das partículas devido a curvatura do espaço-tempo e que representa nessa teoria a interação gravitacional. Assim, diferentemente do espaço-tempo da relatividade Especial, o espaço-tempo da relatividade geral é curvo.   

    Na relatividade especial, nós sabemos que trajetória de partículas livres são retas, já na relatividade geral isso não é possível pois o espaço-tempo é curvo, e não plano.

    A relatividade geral nos fornece as equações necessárias para identificarmos as trajetórias seguidas por partículas livres no espaço-tempo as quais são chamadas de geodésicas. As geodésicas podem ser de dois tipos: nulas para o caso da trajetória de partículas sem massa (ds²=0), e tipo-tempo para o caso da trajetória de partículas massivas (ds²=1).

    Vamos nos deter em detalhes na determinação das geodésicas tipo-tempo as do tipo nula poderão ser obtidas de forma análoga.   

    As equações da geodésica são 4 e temos além disso a condição ds²=1. Temos 4 variáveis a determinar: t=t(t), r=r(t), θ=θ(t) e f=f(t), onde (t,r,θ,f) são as coordenadas  esféricas mais o tempo em termos dos quais escrevemos o espaço-tempo de Schwarzschild, e t é o tempo próprio o qual é parâmetro afim apropriado para descrever trajetórias tipo-tempo. Poderemos então escolher as 5 equações as 4 mais simples. Consideremos que o movimento se dá sobre um plano, por simplicidade escolhamos o plano equatorial: θ = π/2. Se introduzirmos essa escolha nas nossas equações, obtemos que uma vez introduzido as constantes de integração L e E, respectivamente momento angular e energia. Essas duas dão o valor de f e t em função de r. Substituindo esses valores na última equação obtemos uma equação para r aonde só comparecem termos em r. Ela pode ser escrita na forma de uma primeira integral do movimento 

(4)

onde o potencial V²(r) é dado por,

(5)

     A equação (4) difere da equação padrão em física Newtoniana para a primeira integral do movimento pelos termos em e ao invés de V e E. Podemos construir o gráfico de V ²x r para um valor de L fixo, o que dá

Fig. 1

Dessa curva podemos identificar o comportamento qualitativo de todas as possíveis geodésicas tipo-tempo sobre o plano equatorial, o que vai depender de .

    Vamos listar algumas das propriedades mais importantes dessas geodésicas.

(i) Órbitas com periastros em r >>M tem a forma Kepleriana, exceto pela precessão do periastro (caso de Mercúrio).

(ii) Órbitas com periastro em r ≤10M diferem grandemente das órbitas Keplerianas.

(iii) Existem valores de em que teremos órbitas ligadas e não ligadas tais que partículas alcançam periastro e depois retornam para r = ∞.

(iv) Existem órbitas circulares estáveis no mínimo do potencial, e órbitas circulares instáveis no máximo do potencial.

(v)  O potencial só tem um zero e este se localiza em r = 2M ( valor obtido depois da equação (3)).

(vi) Toda partícula que vem do infinito com E² > que o valor máximo de é puxada sem retorno para r =0.

A grande diferença entre a presente situação e o caso análogona gravitação Newtoniana (partícula sobre ação de uma massa M localizada em r = 0) é a presença do poço infinito em acima para valores de r próximos de r=0. No caso Newtoniano tínhamos uma barreira infinita que impedia a aproximação das partículas de r=0.

3.2 - SINGULARIDADE E HORIZONTE DE EVENTOS
.
Assim como o espaço-tempo de Minkowski da relatividade especial tem sua métrica , o espaço-tempo de Schwarzschild tem sua métrica gab dada no elemento de linha ,  

(6)

Notamos que gab não está bem definida em dois valores de r (suas componentes divergem - algumas delas) : r = 2M e r = 0.

    A superfície r = 2M (bidimensional) é o chamado horizonte de eventos, e não é de fato uma singularidade pois em outros sistemas de coordenadas a métrica se comporta bem sobre essa superfície.

    A primeira propriedade interessante dessa superfície que gostaríamos de mencionar é  que usando a relatividade geral podemos recuperar o resultado de Laplace eq.(3) e verificar que o nome de buraco negro se encaixa bem a solução de Schwarzschild.

    Para isso suponha que enviamos radiação eletromagnética do horizonte de eventos para um observador distante r >> 2M. Se a freqüência da radiação medida por um observador no horizonte é r H e a freqüência medida pelo observador distante é rd, podemos relacionar as duas em relatividade geral, no caso de espaço-tempo estáticos por, 

.

(7)

Substituindo os valores de g00 da equação (6), obtemos que, 

,

(8)

ou seja, todas as freqüências são fortemente desviadas para o vermelho. Assim, o observador não irá ver em um tempo finito essa radiação emitida do horizonte. Essa superfície marca a região a partir de onde nada nem a luz pode escapar o que acontece para r < 2M.

    Em relatividade especial identificamos a coordenada temporal observando quais das componentes da métrica é negativa. O mesmo é válido para Schhwarzschild eq.(6). Só que ao cruzarmos o horizonte em direção a r = 0, notamos que o elemento de linha eq.(6) fica reescrito como,


(9)

 E para r <2M, a coordenada radial é que faz o papel de tempo enquanto que t é uma coordenada espacial!

    r = 0 é realmente uma singularidade física, não pode ser removida através de uma transformação de coordenadas. Esse fato traz problemas para a relatividade geral pois em r =0 a curvatura do espaço-tempo diverge e as equações de Einstein perdem o seu poder de previsibilidade. Uma solução para esse problema é que supor que a região em que r <2M, dentro do horizonte, está isolada do resto do espaço-tempo (o que é de fato razoável pois não temos informações sobre o que acontece lá dentro), e fora do domínio de previsibilidade da relatividade geral. E se tivéssemos uma outra singularidade do tipo de r =0, aparecendo em outra solução das equações de Einstein, só que sem o horizonte a envolvendo? ou seja as chamadas singularidades nuas?

    Para evitar esse tipo de situação Roger Penrose propôs o chamado "Cosmic Censorship Confecture" que propõem que sempre que uma singularidade física se forma, juntamente se forma um horizonte de eventos a envolvendo. 

    Ao estudarmos as geodésicas do tipo-tempo notamos que quando uma partícula atravessa o horizonte na direção de r =0, ela não pode mais retornar. Podemos ter uma visão mais clara desse efeito analisando o elemento de linha eq.(9).

    Como r descreve a passagem do tempo dentro do horizonte, temos que o decréscimo em r representa o avanço nos relógios. Assim, se tentássemos retornar para r = 2M estaríamos voltando no tempo o que não é possível. Logo todas as partículas que entravam no horizonte necessariamente vão se encontrar com a singularidade r = 0 em seus futuros.

 

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